quarta-feira, 10 de julho de 2019

GENUÍNO

GENUÍNO

Henrique Fernandes

 Vi meus pais ficarem velhos...
Meus avós virarem quadros...
...meus bisavós tornarem-se lenda,
e meus filhos homens feitos...

Meus netos trazem o jeito
dos moldes deste lugar.
Alheios a tecnologia
preservam a geografia
edificadas em si.

Não somos nenhuma tribo
que vive alheia no mundo.
Somos apenas interioranos
mistificados na raça
patriados de um clã gaúcho.

Neste momento recolho
meus princípios interiores
e recomponho os valores
me transpondo de lugar.

Sou do tempo que o respeito
Não era pra ser bonito,
Era mera obrigação!
Ser justo era dever
E a fórmula do bem viver
Não dependia de cifrão.
Seguimos o dialeto das luas
pra colher e pra semear.
Seus ciclos nos dava o norte
pra não depender da sorte
e a hora certa de enfrenar.

A casa do João Barreiro
de arquitetura barroca,
conforme o lado da boca
se sabia das enchentes.
Quando o ano era de seca,
o barreiro fazia a porta
para o lado do sol nascente.

Assim te explico paysano
que a massa de nosso tutano
tem a essência ancestral...
...Dos homens de cerne duro
que trazem as rédeas do futuro
nas argolas d’um bocal.


 Não nos dobramos ao modismo
de rotineiros padrões.
Nossas bombachas tem favos
e nossas esporas tem cravos
pras baldas dos redomões.

 Nós viemos de um lugar
onde o aperto de mão se mostra
a firmeza do braço...
... que a saudade de um amigo
se mata cevando um mate,
pois quando a saudade bate
nada melhor que um abraço.

Sabemos que por trás dos
cerros existem formas mais fáceis
de dar vida ao pão.
Mas preferimos a terra, o arado e
a enxada, para o milagre do trigo
nos dar a graça do grão.
Ainda temos confiança
nas palavras e nos atos.
 Não lavramos escrituras com
registros cartoriais...
... pois sabemos que as palavras
trazem timbres de bigodes
que não precisam de avais.

Por trás de cada olhar,
vingam esperanças singelas
que não vislumbram ganâncias.
Ficam pra cá da porteira
os sonhos despretensiosos,
restaurados nas molduras
dos quadros dessas estâncias.

Falamos ainda em arroba...
Medimos os campos em quadras...
Adivinhamos as sacas
que brotarão nas lavouras...

As tropas que passam lerdas
nas estradas desses fundos,
se sabe pra onde vai
e de que chão vieram...
Além dos velhos ponteiros
que cruzam assobiando...
Como se fossem de casa
sem nunca passarem antes.


Por mais que o mundo caminhe
sem rédeas rumo ao progresso,
eu troteio no regresso,
na contra-mão do futuro.

E vou contra a correnteza,
pois não busco águas calmas...
São geratrizes terrunhas
que trazem o campo nos olhos
e uma inquietude na alma.

Seu Genuíno...! Fica tranquilo,
que aqui o canto dos grilos
seguirá nas serenatas,
e quando um mocho brazino
se “apartá” do rodeio
e se ‘’infurná” no repecho...
Ahhh, terá um índio vaqueano
desatando um “doze braça”,
dando boca na picaça
inda atada pelo queixo.
...e nós prosseguiremos fazendo taipas,
espichando cercas e arando o chão...
Dando pouso para os bastos
no lombo dos aporreados
que depois de "descurinchados"
vão pras garras do patrão.

Lhes garanto que esta raça
que vos falo e que sustento,
jamais frouxará um tento
embora o tempo persista.

Seu Genuino...! Fica tranquilo,
que os teus sonhos de menino
são os mesmos que desquino
nas loncas de um couro bueno.
Pra os de antes...
...pra os de agora,
e pra os que virão depois,
estará no casco do boi
e no rastro das esporas,
os que embuçalam auroras
com cicatriz de serenos.
Com isso te confirmo
que seguiremos altivos,
campeadores e teatinos,
com filamentos de pampa
na mais beduína estampa
simplesmente genuínos.

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